Vinte e Seis

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Você vai encontrar alguém que goste de você. Daquilo que você é, da sua imagem interna e externa, de tudo que você carrega como bagagem emocional, física e psíquica. Alguém maduro o suficiente pra não te empurrar pra esses joguinhos afetivos. Alguém maduro o suficiente pra te lembrar que o amor se constrói juntos, mas que antes disso vem o próprio, que se constrói a duras penas. Alguém que vai rir da maneira como você toma sorvete. Alguém que te levará a todos os cinemas alternativos da cidade. Alguém que fará da sua própria casa um cinema alternativo para vocês dois. Alguém disposto a lutar por você. Não porque relacionamentos são batalhas e o amor, uma guerra; mas porque é bom diminuir o orgulho, pedir perdão e dizer "fica, por favor, fica". alguém sem melindres, limpo dessa sujeira que a gente tá construindo: se ele não vier falar comigo, eu não vou. Se ele não demonstrar nada, eu também não demonstro. Alguém livre dessas convenções sociais tão, mas tão tristes, que no final das contas tem apartado uns dos outros de estarem bem, quem sabe felizes, até mesmo unidos.
Alguém que vai ouvir toda playlist que você fizer pra ele. E te pedirá pra fazer outras, porque há gosto e vontade de ouvir. Alguém que, igualmente, crie playlists e te mande músicas aleatoriamente. Porque, quando não há papo, há pelo menos música. Alguém que não goste de ir e vir toda hora, mas sim vir e estar. Porque muita gente se acostuma com à ideia de ir embora como uma desculpa pra não estreitar laços, estendê-los ou fincá-los. Alguém que goste do seu cabelo pela manhã, da cor das pálpebras, da largura das costas enquanto você dança pela rua, do seu jeito de falar sobre cinema brasileiro, da textura da voz cantando Gilberto Gil, alguém que vai te olhar nos olhos e pedir perdão pela dor causada. Alguém honesto o suficiente pra te fazer ficar. Alguém que te lembrará diariamente o quão maravilhoso, forte, brilhante e inteligente você é. Alguém que, sem rodeios, vai dizer que te ama. Alguém que se esqueceu do relógio social pra se expressar e se expressa assim mesmo.
Que vai te carregar no colo por pura espontaneidade. Alguém capaz de enxergar a dor em você e querer cuidar dela. Não como se fosse um herói ou o salvador; mas sim como quem diz: "ei, eu estou aqui, você não precisa carregar isso sozinho".
Um dia você encontrará alguém que te lembrará o porquê de você ter estado sozinho por tanto tempo. E você vai agradecer por ter estado sozinho por tanto tempo. Alguém que vai te fazer agradecer todos os dias: a companhia, o tato, a simplicidade, a ternura e o afeto. Alguém que vai saber do centímetro dos seus pés, da espessura da sua solidão em dias mais ocos, da profundidade das cicatrizes que você carregou por tanto tempo sem esperar que um dia alguém te ajudasse na cura. Não que esse alguém vá te ajudar a superar a tudo e todos; é só que esse alguém está disposto, e estar disposto, a essa altura da vida, diz muita coisa. Diz que o peito ainda inflama por pequenezas. Que ainda existe o desejo de amar, porque amar ainda é o que de mais revolucionário pode acontecer no mundo, diz que, embora o caminho da entrega seja tortuoso, lá na frente valerá. Aliás, não só lá na frente. Aqui, agora, também.
Você vai encontrar alguém que assista a todas as suas séries desconhecidas. E ele vai gostar delas. Alguém que não vai reparar no seu nariz maior do que a média, nem vai se importar se o seu corpo é um espaço para caminhos um tanto quanto indesejados. Alguém que te levará a festas, mas que também fará carnavais particulares e bem mais barulhentos dentro de você. Alguém capaz de retirar o peso do mundo dos seus ombros e que não humilhará a sua essência mais densa e cheia de farpas. Pelo contrário: erguerá um altar para sua sensibilidade ter onde dormir. Alguém que te entregue uma adrenalina no peito e que a tome de você no instante exato em que descobrirem o centro do universo um do outro. Será você voando pelo céu de um amor bom.
Alguém capaz de te fazer transbordar na mesma medida em que te fará perceber que você, por si mesmo, é apto a ser feliz e completo, que não vai expropriar aquilo que você é, mas sim acrescentar pele, osso e músculo.
Alguém que vai entregar o coração a fim de que você receba oxigênio, quem sabe amor, até vida. E que não vai ser leviano, afinal, ao perceber que mesmo assim pode acabar. Alguém que saberá a hora exata de partir e não fará desse fato uma tentativa de te partir. Alguém que pode aparecer amanhã, daqui a dez anos ou mais, ou que pode não vir, porque talvez ele seja você.

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