Intensidade

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Eu queria que as coisas não me atingissem tanto. Queria que certas atitudes e pessoas atravessassem a minha vida sem deixar marca alguma. Mas sempre deixam, inevitavelmente, feito tatuagem que não se desbota com o tempo. Cada alma singela que cruza o meu caminho me toca de um jeito diferente, não porque pesam demais, mas porque eu as torno pesadas. Eu faço o corte na superfície da minha pele virar um ataque cardíaco. E viro o mundo de cabeça pra baixo se algum móvel da casa muda de lugar. Você entende a aflição? Tudo nunca é pouco, irrelevante, pequeno. Tudo é muito. Tudo é uma avalanche que me esmaga contra a parede em cada canto que vou, em cada molécula de oxigênio que respiro, em cada átomo que me constitui. Porque eu não consigo não dar importância pra algo que não é importante. Eu choro. Sofro. Me descabelo por inteira, dos pés a cabeça, em todos os lugares. E tudo isso porque o miojo não fica pronto logo. E o porteiro do meu prédio não me dá boa noite. E o shorts que eu mais gosto fica curto demais depois de um tempo. Eu coloco intensidade em tudo porque tudo é intenso demais pra mim. E sinto muito pelo cara que não me liga no dia seguinte. E pela amiga que eu não converso há anos, mas que fez parte da melhor parte da minha infância. E pela roupa que eu não comprei porque não tinha dinheiro. As coisas tomam significados imensos, mesmo sendo minúsculas. E, vez ou outra, me falta ar pra suportar todos os lixos acumulados que coloco na bagagem. É triste ser assim. É triste flutuar e cravar os pés no chão ao mesmo tempo, sentindo todas as deformações do mundo e das pessoas sem sair do meu quarto. Tudo me dói sempre porque eu não sei não doer nunca.

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